quarta-feira, 16 de novembro de 2011

No coração da Igreja, eu serei o amor!

Dom Murilo S.R. Krieger, scj
Arcebispo de São Salvador da Bahia
“Segue-me!” (Mt 9,9). Aceitar o convite que Jesus nos faz para segui-Lo é caminhar pela estrada da santidade. Variam as épocas, as regiões e as pessoas; são também diferentes os modos de se seguir a Jesus Cristo. Do que nenhum cristão está dispensado é da obrigação de acompanhar seus passos. A palavra “obrigação lembra facilmente um peso desagradável, desses que cada um procura se livrar na primeira oportunidade. Não é o que vemos quando nos debruçamos sobre a vida daqueles que aceitaram o convite do Senhor e o seguiram. Há alguém mais livre do que um santo? A liberdade e a alegria, a disponibilidade e a confiança são encontradas em todos os discípulos de Cristo – em Santa Teresinha do Menino Jesus, por exemplo.  
Passados mais de cem anos de sua morte, a jovem, que já aos dezesseis anos de idade, por um favor especial da Igreja, entrou para o Carmelo de Lisieux, continua ensinando que o Evangelho não só é possível como é fonte da mais profunda realização. Impressionam a atualidade e a universalidade de seu testemunho. Ela é admirada por religiosas contemplativas e por jovens que se preparam para o casamento; por executivos de multinacionais e por estudantes universitários; por sacerdotes e donas de casa. Todos percebem que, acima das particularidades da vida dessa carmelita, sobressaem sua busca de Deus, sua intimidade com Jesus e sua confiança inabalável na Providência.
Há os que procuram ir a Lisieux para visitar a casa de Teresinha ou conhecer o Carmelo onde viveu os últimos oito anos de sua vida; há os que adquirem suas obras de espiritualidade; outros preparam teses sobre suas intuições originais. É, porém, lendo seus próprios escritos que se conhece melhor a intimidade de seu coração. Não por acaso, o “Catecismo da Igreja Católica” traz seis pensamentos seus. Um deles é um testemunho a respeito do Evangelho: “Nele encontro tudo o que é necessário para a minha pobre alma” (nº 127); outro esclarece o que significa rezar: “Para mim, a oração é um impulso do coração, é um simples olhar lançado ao céu, um grito de reconhecimento e amor no meio da provação ou no meio da alegria” (nº 2558). Teresinha ensina-nos a grandeza do amor desinteressado: “Após o exílio terrestre, espero ir gozar-vos na Pátria, mas não quero acumular méritos para o céu, quero trabalhar somente por vosso amor…” (nº 2011); a beleza da morte: “Eu não morro, entro na vida” (nº 1011); e a possibilidade de se ter “projetos de trabalho” para a eternidade: “Passarei meu céu fazendo bem na terra” (nº 956).
No entanto, quando o “Catecismo” trata da caridade é que apresenta a melhor síntese da vida de Santa Teresinha do Menino Jesus – síntese que deveria ser assumida por nós como um programa de vida: “Compreendi que se a Igreja tinha um corpo, composto de diferentes membros, não lhe faltava o membro mais nobre e necessário. Compreendi que a Igreja tinha um Coração, e que este Coração ardia de amor. Compreendi que só o amor fazia os membros da Igreja agirem, que se o Amor viesse a se apagar, os Apóstolos não anunciariam mais o Evangelho, os Mártires se recusariam a derramar seu sangue… Compreendi que o amor encerrava todas as vocações, que o amor era tudo, que ele abraçava todos os tempos e todos os lugares… em uma palavra, que ele é eterno!” Depois dessa constatação, Teresinha de Lisieux conclui sua reflexão com palavras que cedo se tornariam clássicas: “Sim, achei meu lugar na Igreja, e esse lugar, meu Deus, fostes vós que o destes para mim… no Coração da Igreja, minha Mãe, eu serei o Amor!”
Tendo esse pano de fundo, ao visitar o Carmelo do Salvador, dias atrás, lembrei às religiosas carmelitas que, diante do vazio das palavras de nosso mundo, Santa Teresinha nos aponta o Evangelho, fonte de vida renovada; diante de uma sociedade marcada pelo materialismo prático, ela chama nossa atenção para o valor da simplicidade, da busca do  essencial; e diante de uma sociedade marcada pelo hedonismo, pela busca do prazer, ela nos ajuda a descobrir o verdadeiro amor, que nada mais é do que a doação radical de nós mesmos.

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